Em um vale castigado
ao extremo pela cruel estiagem que castigava o sertão baiano, num ranchinho
escondido ao lado de um quase escasso olho d'água, morava um velho vaqueiro
solitário, que atendia pela alcunha de "Zezim
Pebão".
Ninguém sabia o seu
nome e todos o consideravam como o maior vaqueiro da região, pois seus aboios
ecoavam nas caatingas e eram ouvidos à léguas de distância, e segundo os
moradores do lugar, este homem perdera sua mulher em uma noite bem escura,
quando juntos caçavam tatu, e ela foi picada por uma urutu cruzeira, serpente
perigosíssima, a mais peçonhenta das jararacas.
Dizem que ele chorou
e sofreu bastante com a perda da companheira, e logo após enterrá-la no
cemitério da cidade, ele sumiu montado em seu cavalo ruano e ninguém mais ouviu
falar dele.
Alguns caçadores
dizem que quando se perdiam durante a noite, sua cantiga os conduziam ao rumo
certo. Na quaresma de Março do ano de 1932, o cangaceiro
Cristino Gomes da
Silva Cleto o "Corisco", junto de Dadá, sua companheira, que na ocasião
encontrava-se grávida, deixaram o bando de Lampião e em trajes comuns,
atravessaram o sertão pernambucano, penetrando na inóspita região do Raso da
Catarina, com destino á cidade de Salgado do Melão, no Estado baiano.
Corisco estava
montado em um vistoso e ligeiro cavalo alazão, e a montaria de Dadá era uma
mansa e linda mula de pelagem rosilha.
Eles cavalgavam
atentos, e com todo o cuidado, pois o estado de Dadá era totalmente delicado.
Foi então que em um lugar longínquo, na região próxima ao Brejo do
Burgo, ao
cair à tarde, cansados da viagem, Corisco escolheu um recanto seguro, entre umas
rochas rodeadas de mandacarus, e sob a sombra de um frondoso pé de jatobá, ali,
ele apeou-se e ajudando Dadá a descer da mula, forrou uma coberta sobre a
vegetação rasteira, acomodando carinhosamente seu cônjuge. E pegando as cabaças
repletas de água, após saciarem a sede, deram água também aos animais,
desarreando-os, deixando-os que pastassem amarrados ali perto deles.

Corisco e seus Cães
Corisco tinha uma
cadela preta e branca, mestiça, da raça perdigueira, que gostava mais dele do
que a própria Dadá, e era ela quem fazia a guarda deles.
Corisco desembainhou
seu facão collins c.o, e foi mais adiante cortar alguns galhos para fazer uma
fogueira onde passariam a noite, e quando vinha vindo com o feixe de lenha nas
costas, avistou uma cotia, que assustada, cruzou correndo sua
frente.
Corisco fez jus ao
nome, e ágil como um raio, disparou um tiro com seu fuzil mauser cal.7 m., vindo
a atingir o ouvido do pequeno roedor.
O jantar já estava
garantido. Após comerem, Corisco improvisando um leito e agasalhando sua
companheira de maneira cômoda, acariciou seus cabelos, fazendo com que sua amada
dormisse tranquila e aconchegante.
Corisco perdera o
sono. Sentou-se em uma pedra ali ao lado, fez um cigarro de palha, e ficou
observando a lua cheia, que morosamente surgia entre os mandacarus, parecia
pressentir o que estava por vir.
Corisco pensava em
chegar logo até Salgado do Melão, pois Dadá estava próxima a entrar em trabalhos
de parto, e isto lhe preocupava muito. Mas de repente sua cadela levantou-se e
ficou de orelhas em pé.
O Diabo Loiro que
não temia nada, vendo algum perigo ali rondar, de imediato acordou Dadá,
deixando-a preparada para enfrentar o perigo oculto nas sombras da noite.
A cadela rosnou e
ficou ao lado de Dadá. Os cavalos começaram a se agitar, um grunhido estranho e
aterrorizante se ouviu à frente. E quando Dadá lumiou com um tição em chamas,
pode-se ver de fronte a Corisco, a figura horripilante de um
lobisomem.
A besta fera era bem
maior que Corisco. Tinha orelhas grandes e eretas. Seus olhos eram vermelhos
flamejantes, igual a duas jóias vindas do inferno. Dentro da bocarra espumante
havia enormes dentes caninos e pontiagudos, entre eles escorria uma baba fétida,
sórdida e gosmenta. As patas superiores apresentavam descomunais garras
afiadíssimas e a pelagem negra, ajudavam-no a se ocultar dentro da escuridão da
noite.
Corisco que já se
encontrava de arma na mão, manobrou seu fuzil e efetuou três disparos em direção
do monstro. Mas para sua surpresa, as balas só amorteciam no pelo dele e caiam
fumegantes no chão. Corisco nem gastou mais munição. Puxou de seu punhal de
prata e ficou na defensiva. O demônio saltou sobre o Diabo Loiro que se
atracaram em uma luta mortal sobre a relva molhada de sereno. Num lapso, o
punhal escapa das mãos do cangaceiro e caindo, se perde em meio a vegetação
rasteira. Nisso, a fera agarra em seu pescoço e vai apertando gradativamente
para matá-lo enforcado.
O valente cangaceiro
se esforça inutilmente, e quando vê os seus olhos já sendo coberto pelo véu
cinzento da morte, numa derradeira tentativa ele passa a mão sobre a grama
achando seu punhal de prata. E assim segurando-o com firmeza, reunindo as
últimas energias do seu corpo, o Diabo Loiro serra os dentes e desfere um
fatídico golpe que atinge violentamente o sovaco do lobisomem, causando-lhe uma
lesão profunda e mortal. A besta solta um urro ensurdecedor, larga o cangaceiro
e sai correndo e sangrando caatinga adentro, até desaparecer na escuridão da
noite.
Corisco segurando o
punhal manchado pelo sangue da fera vai cambaleando até Dadá, que o abraça e
banha com água sua cabeça para ajudá-lo a se recuperar mais rápido, e assim
ambos adormecem.
No alvorecer do dia seguinte Corisco assopra e ateia os tições quase extintos da fogueira, e faz um café. Após quebrar o jejum corisco deixa Dadá em um lugar seguro, e vai campear suas cavalgaduras, e caminhando por alguns minutos, ele localiza os animais a uns oitocentos metros do seu acampamento.
No alvorecer do dia seguinte Corisco assopra e ateia os tições quase extintos da fogueira, e faz um café. Após quebrar o jejum corisco deixa Dadá em um lugar seguro, e vai campear suas cavalgaduras, e caminhando por alguns minutos, ele localiza os animais a uns oitocentos metros do seu acampamento.
Corisco ao se
aproximar, avista um ranchinho ao lado de um pé de aroeira, e quando chega mais
perto, vê pelas frestas de madeira um velho deitado numa tarimba, gemendo de
dor. Corisco pega seu parabelliun 9 m. e vai pra bem perto do cabra, pergunta:
- Ei! môço, o quê ta
se sucedendo com o sinhô?
E o moribundo
responde:
- Ai!aaai! eu fui
cortá lenha nu mato i trupiquei num cipó i na queda cai com u subacu im cima
duma ferpa di pau, ai!ai! óia moço, pega sua muiê e suma daqui antes di iscurecê
antis da lua saí.
Corisco perguntou
novamente:
- Diga então veio,
pelo menu seu nome?
E ele
respondeu:
- É "Zezim Pebão".
Agora fais o que tô mandandu. Si arranca daqui cabra da mulestra!
Sem desconfiar de
nada o cangaceiro pegou seus animais e se foi. Chegando ao acampamento Corisco
arriou os animais e partiu rumo ao lugarejo chamado Salgado do Melão, e assim
quase turvando o casal, chegou na supracitada cidade,
Corisco levou Dadá
para casa e deixou a companheira aos cuidados dos parentes. E foi até uma venda
comprar o que precisava, e lá, bebendo umas pingas e proseando com o povo ele
perguntou:
Arguém di oceis
cunhece um tar "Zezim Pebão"?
Dai um sertanejo por
nome Zé Osmídio respondeu que sim, e contou toda a verdade a Corisco, que
cismado e surpreso, foi para junto de Dadá. No outro dia já estava
viajando de volta para Pernambuco, com destino ao coito de seu compadre
Lampião.
Pois é amigos, este é mais um fantástico caso do cangaço e de cangaceiros.
Se é verídico cabe a você analisar.
Pois é amigos, este é mais um fantástico caso do cangaço e de cangaceiros.
Se é verídico cabe a você analisar.
Francisco
Carlos Jorge de oliveira é da policia militar paranaense, e contador dessa interessante história do cangaço neste blog.